1 de mar. de 2012

Foto clube apresenta novas paisagens no Alemão

Flávia Costa gosta de paisagens humanas

Um grupo de 26 pessoas de diferentes idades e origens percorreu o complexo do Alemão no sábado, 25, em busca de visões pouco conhecidas do bairro. Apoiando-se em escadas e pequenos elevados e fazendo contorcionismos em busca do melhor ângulo, entre as 16h30 e 19h eles clicaram soldados da Forças de Paz do Exército Brasileiro,  o teleférico , ruínas de barracos abandonados, moradores se divertindo e sorrisos de crianças, que pediam: “Moço, tira uma foto?”.
Era mais uma saída do  Foto Clube Alemão, que  desde 3 de março de 2011,vem revelando novos fotógrafos na  localidade.  Fundado por Bruno Itan – um jovem fotógrafo da comunidade, que desde o ano passado faz parte da equipe jornalística da assessoria do Governador Sérgio Cabral – o grupo já tem 5 mil fãs na sua página no Facebook , atrai pessoas de outros bairros e até estrangeiros para suas saídas semanais e começa a estimular iniciativas semelhantes em outras comunidades.
Tudo começou em novembro de 2010, quando o morro vivia dias de ocupação pelo Exército.   Bruno fotografou a operação, em locais acessíveis apenas a quem conhece o Alemão por dentro, onde a maioria dos profissionais de imprensa não conseguia alcançar. Na ocasião,  chegou a passar por momentos de tensão. “Tirei fotos tão surpreendentes que um policial pediu que eu apagasse 450 imagens, dizendo que poderiam me prejudicar no futuro”, disse.
Bruno ganhava a vida alternando o trabalho de lavador de carros e os bicos como fotógrafo em festas de 15 anos, casamentos e eventos. Com suas economias, adquiriu uma nova câmera e , entusiasmado com o sonho de fotografar, abandonou o lava-jato. “As pessoas me alertavam que a vida de fotógrafo era difícil. Sempre me questionavam se era isso mesmo o que eu queria, pois eu iria passar perrengue…”, lembrou.
As fotos de Bruno começaram a chamar a atenção quando ele começou a documentar as obras do PAC2 e a construção dos teleféricos na comunidade. O trabalho lhe valeu  o convite para expor as fotos no local da  inauguração do teleférico. “Daí para frente, muita coisa boa aconteceu na minha vida”, relatou, com brilho nos olhos. Uma delas, o convite do próprio governador, feito na festa, para juntar-se à equipe do Palácio Guanabara.
Mesmo empregado, Bruno não deixou de focar sua própria comunidade com os amigos Dhani Borges, seu primeiro professor de fotografia, e Maycon Brum, fundou o Foto Clube Alemão, no início de 2011. “Quis compartilhar novos olhares sobre a minha realidade, também com outros fotógrafos”, disse.
Hoje o Foto Clube agrega cerca de 80 interessados em fotografia e já é necessário usar crachá para identificar os participantes das saídas aos sábados. O Foto Clube tem seis câmeras – uma doada pelo apresentador Luciano Huck –, utilizadas em rodízio pelos  que ainda não tiveram a oportunidade de adquirir uma máquina própria.
É o caso da estudante Flavia Costa, de 17 anos, que, assim como Bruno, também é moradora do Alemão. Descansando o peso da máquina no ombro, como faria um violinista, ela faz questão de dizer que gosta de tirar fotos “de gente”. “Meu interesse por fotografia surgiu a partir de uma máquina amadora, que eu pegava do meu tio. Saía pela comunidade fazendo fotos, sempre escondida, sozinha, sem ele saber. Mostrei-as ao Bruno, que elogiou o meu trabalho e me chamou para integrar a equipe no ano passado”, disse a jovem, conhecedora dos becos do Alemão.  “Geralmente, as pessoas ‘da pista’ pensam que a favela é perigosa. Que nada! A maioria dos moradores que são flagrados por nossas câmeras ficam alegres quando registramos imagens deles, principalmente as crianças, que pedem para ver o que saiu”.
Há quem venha de fora da comunidade para fotografar as vielas do complexo. Há um ano morando no Rio,  o italiano Marco Bucci conheceu Bruno através do portal Rio Fotográfico, que reúne fotógrafos da cidade em busca de trocas de experiências e, principalmente, de imagens. No sábado, ia pela terceira vez acompanhar o grupo. “Para mim, que sou gringo, é novidade poder ver de perto a pobreza e a desigualdade social que não existem de forma tão gritante na Europa. Gosto das paisagens humanas”.
Flávio Ribeiro, de 34 anos, veio de Maricá, atraído pelo perfil do Foto Clube no Facebook. “É a primeira vez que venho ao Alemão. Estou aproveitando a chance de conhecer a realidade que eles estão vivenciando na pacificação e quero registrar um ‘algo mais’, diferente do que já estou acostumado a ver na TV”, disse.
Edson Silva, de 39 anos, afirma que seu interesse surgiu através de seu sobrinho, Bruno. “Sou operador de laboratório, mas estou adorando a fotografia. Eu morava lá embaixo, na ‘pista’, mas, só agora, depois de 12 anos morando aqui – e com o Alemão pacificado -, pude obter outro olhar sobre a comunidade. Eu era praticamente ‘cego’, no lugar em que vivia. E acho que as minhas fotos melhoraram muito, do ano passado para cá”, disse, entusiasmado.
O sucesso do Foto Clube Alemão vem inspirando outras comunidades do Rio e do Brasil. Inaugurado em janeiro deste ano, o Foto Clube das Favelas da Zona Sul tem organizado saídas em comunidades daquela região. Em Pernambuco, também foi inaugurado, no último mês, o Foto Clube de Itamaracá.  “ É a possibilidade de fazer o movimento fotográfico da cidade e do país crescer. Mostramos que há algo mais, para além do que já é retratado nos jornais diários, porque vemos a comunidade de forma afetiva, nos sentindo mais à vontade aqui”, destacou.
No final de mais uma aventura, os fotógrafos foram até o ponto mais alto do morro, na Capela de São Sebastião, onde, ao por do sol, via-se a Igreja da Penha. Esta, o destino da próxima saída do Foto Clube Alemão, neste sábado, dia 3, comemorando um ano de cliques e histórias para contar.


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